Durante o Seminário Nacional “Matopiba; Conflitos, resistência e novas dinâmicas de expansão do agronegócio no Brasil”, as diversas representações de comunidades tradicionais, movimentos sociais, entidades que apoiam a preservação do meio ambiente, pesquisadores e acadêmicos, trocaram experiências sobre a vida no cerrado nas regiões do Maranhão, Piauí, Tocantins, Bahia e Moçambique. A apresentação das realidades de cada região mostrou que o agronegócio traz desigualdade social, desemprego, pobreza nos municípios e, o mais grave, é o descaso com a soberania alimentar.
O plano de desenvolvimento do agronegócio Matopiba, apresentado em 2015 pelo governo federal gera consequências negativas para o bioma do cerrado, algumas irreversíveis ecologicamente, como a diminuição do volume de água dos lençóis freáticos e dos rios, impactos no modo de vida das comunidades tradicionais, envenenamento das águas e impactos na saúde pelo uso intensivo dos agrotóxicos. Além disso, o projeto também causa a grilagem de terras, aumento dos conflitos e da violência no campo, destruição dos assentamentos e da agricultura familiar e aumento do desmatamento.
Segundo Isolete Wichinieski, da Comissão Pastoral da Terra e coordenadora da Campanha Sem Cerrado, existem vários projetos no Congresso que também interferem no plano Matopiba, exemplo disso, é o Projeto de Lei 4059/12 que regula compra de terras por estrangeiros. “Se isso for aprovado, facilitará ainda mais o financiamento de terras para estrangeiros, com interesses do agronegócio, justamente nas áreas do cerrado. Tivemos uma audiência no Senado e apenas uma senadora esteve presente. Então, é claro a falta de interesse na discussão por parte dos parlamentares. A voz que ecoa das comunidades que vivem na região, principais afetados pelo Matopiba, é de que não querem esse modelo de desenvolvimento, mas não há um respeito dos poderes públicos por isso “enfatiza.
Um dos objetivos do seminário é ampliar o debate do Matopiba em todos os níveis, municipal, estadual, nacional e internacional. Em Moçambique, por exemplo, a situação é de extrema violência no campo. “Nossa situação política é de guerra e até agora não temos paz, o moçambicano está chorando para ter paz e viver livre, lá convivemos com a usurpação de terra dos camponeses”, relata a representante de Moçambique, Helena Terra.
De acordo com Rosival Leite, coordenador estadual da Fetraf Bahia, muitos agricultores perderam suas áreas, onde a produção era da agricultura familiar. “Presenciamos diariamente os conflitos no campo, são os grandes fazendeiros e proprietários do agronegócio colocando seus jagunços para coagir nosso povo. Agora, com esse processo de estrangeirização das terras o problema se consolida cada vez mais”, conta.
No Maranhão a realidade não é diferente, sem contar com a manipulação da informação pela grande mídia sobre o agronegócio. “Não foi um assunto debatido com as reais informações de impactos para as comunidades. Entendemos que o Matopiba não é só uma expansão da fronteira agrícola, a estratégia é bem maior. Envolve exportação, ferrovia, hidrovias, portos, a retirada de comunidades tradicionais das suas zonas, exploração da terra sem sustentabilidade, estrangeirização das terras e muito mais. O debate de resistência é necessário e urgente”, explica Maria da Graça Amorim, coordenadora de mulheres da CONTRAF BRASIL e da Fetraf Maranhão.
Vizinho, o estado do Piauí sofre com a extração do solo devido as grandes áreas de soja na região e o descaso político do governo federal e estadual com os assentamentos da reforma agrária. “Provamos para qualquer empresário e Governo que a fala pregada por eles de plano de desenvolvimento é equivocada. Eles argumentam, por exemplo, que o eucalipto é uma forma de colocar o nordeste verde, engano, quando podemos ter outras culturas como o caju e bacuri que superam em número e qualidade de vida. Provocamos o diálogo e às comunidades para que não aceitem a imposição técnica elaborada pelas multinacionais”, critica Antônio Chaves, coordenador de da política agrária da FAF Piauí.
Entre os dias 16 e 18 de novembro a CONTRAF BRASIL contribui com a construção dos encaminhamentos como a agenda de ações e relatos das comunidades que deverão compor uma carta para ser entregue aos governos. “Vamos ampliar este debate para os municípios e estados para garantirmos a preservação do Cerrado, a produção da agricultura familiar, as comunidades tradicionais, a produção da água, além de fortalecer nosso movimento pela defesa desse bioma, que é tão importante, o Cerrado brasileiro”, avalia Lázaro Bento, coordenador de gestão e finanças da CONTRAF BRASIL.