A reportagem divulgada pelo Fantástico (rede Globo), no último domingo (24), mostrou a ilegalidade na compra de terras que deveriam ser destinadas à assentamentos da reforma agrária, no município de Cumuruxatiba, no sul da Bahia.
A primeira denúncia oficial, ocorreu em outubro de 2003, pelo Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Sintraf) do Vale do Jucuruçú, e pela Associação Comunitária Pequenos Produtores Projeto de Assentamento (PA) Cumuruxatiba, apontava a venda de quatro lotes em assembleias que contaram com a participação de representantes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), além da retificação da portaria de criação do PA que aumentava de 125 para 211 a quantidade de famílias que seriam assentadas, desrespeitando a reserva de mata atlântica dos lotes.
Todas essas ações foram feitas com a participação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Prado, filiado à Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB). Segundo a matéria veiculada, e o próprio depoimento de moradores, o STR recebe propina pela venda dos lotes.
“Antes de protocolarmos a denúncia na Ouvidoria Agrária do MDA [Ministério do Desenvolvimento Agrário] denunciávamos essas falcatruas na Unidade Avançada do Extremo Sul da Bahia desde 2002, mas até então não sabíamos que tinha também não apenas o dedo, mas a mão inteira do INCRA nessa história”, contou Pedro dos Anjos, presidente do Sintraf Vale do Jucuruçú.
Embora em 2004, tenha sido aberto Processo Administrativo de Sindicância Investigativa, para apuração do crime, por meio da ouvidoria Agrária Regional (SR-05), a comissão de investigação era composta por servidores do INCRA-Bahia o que travou o processo.
No documento enviado ao desembargador José Gersino da Silva, ouvidor Agrário Nacional, o Sintraf Jucuruçu, relata o abandono das investigações por parte da comissão investigativa que “passa a questionar os denunciantes e a ingerir na administração da associação”, mesmo com a presença de provas como, por exemplo, atas de assembleias que identificam a venda dos lotes.
Antes de chegar à Ouvidoria Agrária Nacional, as denúncias foram protocoladas no MDA, Ministério da Justiça, Advocacia Geral da União e INCRA Nacional. Em 2006, o SINTRAF Jucuruçu, reivindica ao Desembargador Gercino, Ouvidor Agrário Nacional, que afaste o INCRA no estado do Projeto de Assentamento Cumuruxatiba, uma vez que ele realizou o cadastro de empresários para acesso ao lote, participou da ocupação, cadastramento e titulação das áreas de Reserva Legal.
Celso Lacerda, presidente do INCRA Nacional informou que o órgão irá até a última instância que é a ação judicial de retomada das terras. Na Bahia, existem mais de 30 ações de reintegração de posse desses lotes ocupados.
De acordo com Elisângela Araújo, coordenadora Geral da FETRAF-BRASIL, o cenário da reforma agrária no Brasil, exige medidas urgentes a serem tomadas pelo governo.
“Vários aspectos precisam ser tratados e reformulados. Primeiro, vivemos com a impunidade e a violência cada vez mais crescente no campo e uma justiça que não funciona quando o assunto é reforma agrária. Temos um órgão responsável pela reforma que não tem poder para agir, que precisa ser reestruturado para que seja um espaço dentro do governo que efetivamente conduza o processo de acesso à terra aos trabalhadores e, consiga estruturar a produção que é necessária e vinculada à reforma agrária”, avaliou Elisângela.
Segundo a coordenadora, a FETRAF-BRASIL continuará vigilante e ativa para cobrar a adoção de medidas para acabar com os conflitos, a mortalidade no campo e a realização da reforma agrária. Entretanto, “se o governo se omitir, compreenderemos que ele não tem interesse em fazer a reforma, não sendo prioridade política do governo”, considerou.