A atenção especial às mulheres será o foco da atuação de 65 profissionais que vão levar, a partir de fevereiro, assistência técnica rural a 4.480 famílias de 39 comunidades quilombolas na Bahia, Pernambuco, Maranhão e Minas Gerais. Os técnicos estão em fase de capacitação para organizar mutirões de documentação, auxiliar na criação de cooperativas e de associações e estimular a superação das diferenças de gênero no campo. Dados do Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que um entre cada quatro brasileiros que vivem no campo está em situação de extrema pobreza. No Nordeste, 48,5% dessa população é mulher.
“Historicamente, e, principalmente no meio rural, as mulheres são as mais afetadas pela extrema pobreza. As dificuldades começam com a documentação e vão até o acesso às políticas públicas”, diz coordenadora de Acesso à Terra e Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Márcia Riva. Ela participa esta semana, em Salvador, da capacitação para técnicos rurais que vão trabalhar em comunidades quilombolas promovida pelo MDA e pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).
Márcia conta que entre as mulheres em extrema pobreza do meio rural chefes de família 1,6 milhão não têm rendimento próprio. O menor acesso das moradoras do campo aos recursos fica mais claro nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, também feita pelo IBGE. A pesquisa mostra que, enquanto um homem recebe, em média, R$ 84 mensais pelo trabalho na produção agrícola, o rendimento médio delas é de apenas R$ 9 mensais.
Políticas setoriais
Nos últimos anos, o governo federal implantou uma série de políticas setoriais voltadas às mulheres do meio rural. A Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) com recorte de gênero, criada em 2004, atendeu mais de 51 mil mulheres do campo, com qualificação da gestão, produção e comércio agrícola. Outro exemplo é o Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf), que beneficiou mais de 38 mil mulheres, num total de R$ 272 milhões em créditos especiais para a produção feminina no campo.
No Brasil Sem Miséria, a meta é que pelo menos 30% dos beneficiários de Ater sejam do sexo feminino. Os projetos de fomento e de organização produtiva devem levar em conta a qualificação da produção, seja na panificação, em hortas, no extrativismo, no artesanato, na criação de pequenos animais ou na agricultura familiar. O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) terá ao menos 5% de sua dotação orçamentária anual direcionados para organizações compostas exclusivamente por mulheres ou com participação mínima de 70% delas.
Márcia Riva entende que tirar as mulheres rurais da invisibilidade e da situação de extrema pobreza envolve, antes de mais nada, torná-las visíveis para o Estado. “O primeiro passo, a primeira ação, é a documentação, a partir dos mutirões do Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural”, destaca. Ela afirma que, em 2011, a partir do lançamento do Brasil Sem Miséria, foi possível, na Região Nordeste e no norte de Minas Gerais, emitir mais de 55 mil documentos para 20 mil mulheres. “Com o documento, elas exercem a cidadania, passam a existir para o Estado e, consequentemente, podem ser alvo de políticas setoriais”, explica.
Ater quilombola
Nas 39 comunidades quilombolas a serem visitadas pelos técnicos, a orientação é criar mecanismos para as mulheres acompanharem o diagnóstico e a elaboração dos projetos produtivos individuais e coletivos. Esses mecanismos vão desde a criação de espaços recreativos para as crianças, que propiciem tempo livre às mães para participar das discussões, até o método de abordagem dos técnicos ao fazer as entrevistas em cada residência. “A abordagem deve ser igual para todos os membros da família: homens, mulheres, crianças, jovens”, diz Márcia.
Segundo ela, algumas estratégias simples precisam ser observadas, como, por exemplo, a escolha do local da entrevista, para trazer as mulheres e criar espaços nos quais elas se sintam ouvidas e contempladas nas demandas daquele grupo familiar. “Antes, era comum a abordagem da Ater ocorrer na roça, no galpão, locais em que as mulheres circulavam menos. Nessa nova lógica, é importante que o contato ocorra nos ambientes em que as mulheres estão: nos quintais, nas hortas ou na cozinha”, salienta.
* Fonte MDA