Escirto por Fenanda Silva e Thiago Alves, em Brasília
Foto: Luiz Carvalho
Na luta por garantir participação social e controle sobre os bens naturais e o desenvolvimento dos territórios, os trabalhadores do campo, reunidos no Parque da Cidade, em Brasília, no Encontro Unitário dos Povos, discutiram a importância da soberania energética nos moldes do desenvolvimento sustentável.
Com diversos relatos sobre a precarização do trabalho, a exploração da mão de obra e a degradação do meio ambiente, resultantes do papel do Brasil enquanto fornecedor de matérias primas para o mundo, integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) desabafaram sobre os abusos sofridos.
Na cidade de Resplendor, por exemplo, localizado no leste de Minas Gerais, a permanência da população no local está ameaçada. Segundo Yolanda Licéria, moradora da região, no rio Doce não existem mais peixes. “Só há um lago de lama podre. Ratos e baratas invadem nossa casa e as ruas. Queria que as pessoas passassem a enxergar que lá existem vidas”, desabafou.
Com a exploração do minério do país, que em agosto de 2011 chegou a marca de 32,47 milhões de toneladas exportadas, gerando US$ 4,47 bilhões, as mulheres se tornam as maiores vítimas desse processo. No documento produzido pelos sistematizadores da oficina, que será apresentado ao plenário, consta a importância da luta contra exploração sexual, a submissão e a invisibilidade das mulheres, assim como a participação feminina nos espaços de decisão.
Nesse sentido, enfrentar o poderio econômico das transnacionais que tentam se apropriar das fontes de energia deve ser o primeiro passo da luta dos movimentos.
De acordo com Gilberto Cervinski, da coordenação nacional do MAB, o tema da soberania energética deve partir de quatro ideias centrais, sendo: a derrota das transnacionais, a defesa dos recursos naturais que, por ser alvo dos empresários, geram a exploração dos agricultores, pescadores, cortadores de cana, etc., o rompimento com a lógica da exportação barata da matéria prima e a luta contra os altos preços da tarifa da energia elétrica.
Para ele, trabalhar pelo controle social significa lutar para que o povo tenha o controle sobre todas as fontes de energia e seus resultados. “É uma luta estratégica, uma luta de classe, pelo controle da água, dos rios, para derrotar as transnacionais. É a luta contra a privatização. Hoje se constrói grandes obras nesse país e essas obras fazem parte de um grande modelo de desenvolvimento que não que do povo e não é para o povo”, disse.
Sobre a alta tarifa da energia elétrica, Gilberto atenta para a necessidade de mudar o procedimento e impedir que ela “se torne a principal fonte de arrecadação das grandes empresas que consegue com ela lucros extraordinários. E ataca o modelo energético que queremos”.
Nessa perspectiva, o desenvolvimento dos territórios é uma questão central, conforme abordou Marcelo Leal, da direção Nacional dos Pequenos Agricultores (MPA), um dos expositores da oficina sobre o tema.
“A luta pela soberania energética casa-se também com a luta pela soberania alimentar e a luta pelo modelo tecnológico porque hoje as nossas bases que produzem matéria para as grandes empresas são petrodependentes”, afirmou Leal.
Ao ressaltar a atuação do movimento camponês, que é capaz de desenvolver formas de produção com controle social, proteção ambiental e geração de energia, com base em princípios agroecológicos, Marcelo falou sobre a importância da comunidade de produção, unidade camponesa e do território, que faz com que o campo tenha uma escala de produção e cooperação no território, e de cobrar do Estado brasileiro sua função. “É central para nós não aliviar a barra do Estado e resgatar o conceito real das políticas públicas. Temos que bater no estado brasileiro para que a gente conquiste não apenas políticas, mas o controle estratégico das ações”, afirmou.
Ao final da oficina os agricultores e agricultoras presentes foram motivados a criar um grito de ordem que animasse toda a plenária do Encontro Unitário e sintetizasse o debate feito na oficina. Os presentes acolheram propostas e definiram que o grito de ordem que resume em profundidade o tema da soberania energética com todos os conteúdos debatidos é: “Mulheres, minério, água e energia não são mercadorias”, que foi repercutido por mais de 100 pessoas presentes.