O Programa Nacional de Alimentação Estudantil (PNAE) foi criado para oferecer merenda a mais de 40 milhões de estudantes da rede pública de todo o país. O governo federal repassa a estados e municípios anualmente R$ 4 bilhões para que façam a distribuição por lei e, 30% desse valor, tem que ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar. Hoje, o PNAE é uma ferramenta de comercialização muito importante para 4,5 milhões de pequenos produtores de todo o país.
Especialistas propõem 10 temas para mudar ensino sobre o agro nas escolas
“Normalmente, eles têm uma produção muito pequena e essa produção acaba sendo comercializada por intermediários que acabam no final da história ficando com a margem. Então, o produto final chega na escola de forma mais fresca, mais rápida, evitando o intermediário e o produtor se beneficia com um preço melhor”, explicou o produtor rural e prefeito de Ibitinga (SP), Frauzo Sanches
Em uma live produzida pelo Instituto Fome Zero, especialistas discutiram a importância econômica e social do programa, já que a agricultura familiar é responsável por 70% dos alimentos consumidos no Brasil e traz benefícios na área da saúde pública.
O representante do Programa Mundial de Alimentos da ONU, Daniel Balaban, explicou a importância de uma alimentação completa na saúde da população. “Hoje, 90% das doenças estão relacionadas com a má alimentação. Isso no mundo inteiro. Então se a gente aprende a se alimentar bem desde cedo, a gente não vai ter os problemas de saúde que a minha geração teve. Antes da lei era muito produto nutricionalmente inadequado, para não dizer outra coisa, ou seja, era pura química”.
Com a pandemia e a suspensão das atividades presenciais nas escolas, a compra e a distribuição desses alimentos foram muito impactados. Um estudo feito pelo Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar mediu o prejuízo para a agricultura familiar. Eles usaram como base comparativa um grupo de 4,5 mil produtores de 108 municípios brasileiros. Em 2019, eles venderam para o PNAE R$ 27 milhões. Já em 2020, até setembro, quando foi concluída a pesquisa, a rentabilidade desse mesmo grupo foi de apenas 3,6 milhões, ou seja, uma redução de 87%.
Em abril de 2020, o Congresso autorizou, em caráter excepcional, que os alimentos adquiridos com recursos do PNAE pudessem ser distribuídos aos pais ou responsáveis dos estudantes durante o período de suspensão das aulas. O benefício foi entregue em forma de cestas. A medida foi importante, mas não atendeu a todos os setores.
Para Sanches, alguns produtores se sentem prejudicados, como os de folhosas. “Em Ibitinga e outros municípios ocorreu a distribuição do kit merenda. Então, produtos como beterraba, cenoura é mais fácil de colocar no kit. As folhosas, alface, couve, salsinha, cebolinha, que também são muito compradas na agricultura familiar, num primeiro momento não foram distribuídas e muitos produtores acabaram perdendo no ano de 2020”, explicou.
Muitos gestores públicos optaram por kits secos, processados e embalados. De acordo com nutricionistas, essa decisão abriu mão da qualidade nutricional, além de prejudicar a agricultura familiar.
“O Rio grande do Sul, por exemplo, se organizou para fazer um frente de diálogo com o governo do estado do Rio Grande do Sul para poder fornecer arroz, feijão da agricultura familiar e o governo do estado fez uma única compra, de uma grande rede de supermercados, num processo licitatório muito pouco transparente quando poderia ter aproveitado dessa compra pública para fortalecer a sua agricultura familiar”, disse Mariana Santarelli, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional.
Para os especialistas, enquanto as escolas não voltarem à rotina normal, é importante que os gestores públicos respeitem a essência do programa: oferecer alimentação de qualidade aos estudantes e dedicar pelo menos 30% dos recursos à agricultura familiar. “Favorecer a agricultura familiar e o pequeno comércio é muito importante. Faz a roda da economia do município girar mais vezes. Esse real que entra para ele, gira duas ou três vezes mais em outros”, concluiu o prefeito de Ibitinga.